O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) afirmou nesta quarta-feira (17) que as declarações do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) não estão protegidas por imunidade constitucional e que suas condutas “criminosas” configuraram flagrante, autorizando sua prisão.
O ministro, que determinou a prisão em flagrante do deputado na noite desta terça (16), foi o primeiro a se manifestar no julgamento que decidiu, por unanimidade, pela manutenção da prisão do deputado.
Investigado por participação em atos antidemocráticos, Silveira divulgou um vídeo com discurso de ódio atacando ministros do Supremo e no qual faz apologia do AI-5, instrumento de repressão mais duro da ditadura militar.
“As manifestações de Daniel Silveira relevam-se gravíssimas, não somente do ponto de vista pessoal, mas principalmente do ponto de vista institucional e do estado democrático de direito”, afirmou o ministro Alexandre de Moraes.
Segundo Moraes, as afirmações não estão protegidas pela imunidade parlamentar.
“Atentar contra as instituições, contra o STF, contra o Poder Judiciário, contra a democracia, contra o estado de direito não configura exercício da função parlamentar a invocar a imunidade constitucional”, afirmou.
De acordo com o ministro, essas manifestações não atingiram somente a honra dos ministros, “mas principalmente se revestiram suas declarações de claro intuito visando impedir o exercício livre da judicatura, o exercício independente do Judiciário e a própria manifestação do estado de direito”.
“Suas manifestações, sua incitação à violência, não se dirigiram somente a diversos ministros da Corte, chamados pelos mais absurdos nomes”, complementou. “Dirigiram-se diretamente a corroer as estruturas do regime democrático, a correr a estrutura do estado de direito.”
Conforme Moraes, “muito mais do que crimes contra a honra praticados contra ministros e o STF, muito mais do que ameaça à integridade e à própria vida de ministro, muito mais do que ofensas pesadas, aqui as manifestações tiveram o mesmo intuito que outras manifestações: de corroer o sistema democrático, de abalar o regime jurídico do estado democrático de direito brasileiro”.
Ao dar início à sessão, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, afirmou que o tribunal se mantém vigilante contra qualquer forma de hostilidade à instituição e que “ofender autoridades além dos limites da liberdade de expressão exige pronta atuação da Corte”.
Prisão
Silveira foi detido no fim da noite em Petrópolis, na Região Serrana do Rio, e passou a madrugada preso na sede da Polícia Federal no Rio de Janeiro, na Zona Portuária da cidade. Na decisão, o ministro afirma que houve reiteração de conduta “visando lesar ou expor a perigo de lesão a independência dos Poderes instituídos e ao Estado Democrático de Direito”.
Ainda segundo Moraes, as condutas de Daniel Silveira, além de representarem “crimes contra a honra do Poder Judiciário e dos ministros do Supremo Tribunal Federal”, são previstas como crimes na Lei de Segurança Nacional.
Mesmo em flagrante e por crime inafiançável, a prisão de um deputado federal precisa passar pelo crivo da Câmara. Na decisão, Moraes diz que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), deveria ser “imediatamente oficiado para as providências que entender cabíveis”. Nesta quarta, a Câmara foi notificada.
A assessoria do deputado afirma ser “evidente o teor político da prisão” e que os fatos que a embasaram “sequer configuram crime, uma vez que acobertados pela inviolabilidade de palavras, opiniões e votos que a Constituição garante aos deputados federais e senadores”.
Vídeo
No vídeo, postado em rede social, o bolsonarista Silveira faz ataques a seis ministros do STF: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli. Também defende o fechamento do STF, o que é inconstitucional.
O deputado sai em defesa do general Eduardo Villas Boas, ex-comandante do Exército. Em 2018, na véspera do julgamento no Supremo de um habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Villas Boas afirmou em rede social que o Exército tinha “repúdio à impunidade”.
A declaração foi vista como pressão sobre os ministros do STF. Fachin era o relator do pedido de liberdade de Lula, rejeitado pelo plenário da Corte.
Em livro recém-lançado, o ex-comandante disse que, na época, a manifestação foi discutida com o alto comando do Exército antes de ser publicada.
O deputado é investigado no Supremo no inquérito que apura a organização e o financiamento dos atos antidemocráticos e no que investiga ataques a ministros da Corte e a disseminação de notícias falsas, o chamado inquérito das fake news.
No ano passado, ele foi alvo de busca e apreensão e teve seu sigilo bancário quebrado. No pedido de investigação, a Procuradoria-Geral da República apontou que o deputado pregou o uso das Forças Armadas contra o Supremo e que há uma ligação dele com movimentos extremistas conservadores.
Nesta segunda-feira, Fachin reagiu em nota dizendo ser “intolerável e inaceitável qualquer forma ou modo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário. A declaração de tal intuito, se confirmado, é gravíssima e atenta contra a ordem constitucional. E ao Supremo Tribunal Federal compete a guarda da Constituição”.
Daniel Silveira está no primeiro mandato como deputado federal. Eleito em 2018, o ex-policial militar ficou conhecido por aparecer em vídeo destruindo uma placa que homenageava a vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio em março daquele mesmo ano.
Informações PortalG1 / Foto: Betinho Casas Novas