Por um lado, opõem-se a ações militares do Hezbollah e à forma como o grupo implementou um Estado paralelo em áreas do país. Ao mesmo tempo, condenam a invasão e os ataques israelenses ao Líbano
Umas das mais poderosas figuras políticas cristãs libanesas e maior crítico ao Hezbollah em Beirute, Samir Geagea faz questão de condenar os bombardeios de Israel ao Líbano. Acrescenta não querer ver a destruição grupo xiita na atual guerra, embora defenda uma redução da hegemonia internamente. Outro grande líder cristão libanês, Gebran Bassil, aliado político, embora não ideológico, da organização apoiada pelo Irã, critica com ainda mais dureza os ataques de Israel ao país. Preferido dos EUA para ser presidente, o comandante das Forças Armadas, Joseph Aoun, segue na mesma linha e mantém distância dos israelenses.
Essas lideranças cristãs maronitas representam o atual sentimento de muitos libaneses, independentemente da religião. Por um lado, podem se opor a ações militares do Hezbollah e à forma como o grupo implementou um Estado paralelo em áreas do país. Ao mesmo tempo, condenam a invasão e os ataques israelenses ao Líbano, que passaram a atingir áreas sem nenhuma relação com o grupo xiita e mataram centenas de civis inocentes.
Um dos recentes bombardeios de Israel atingiu o pequeno vilarejo cristão maronita de Aitou, no norte, a mais de 100km da fronteira com o território israelense e em uma região sem presença do Hezbollah – qualquer um que conhece o Líbano sabe que se trata de uma área cristã sem ligação com o grupo. No ataque sem aviso de Israel, 21 pessoas morreram, incluindo crianças. Assim como a quase totalidade dos habitantes, as vítimas eram cristãs maronitas, que seguem uma vertente do cristianismo de rito siríaco e em comunhão com o Vaticano. A ação naturalmente gerou repúdio entre os cristãos libaneses de diferentes denominações, que representam cerca de 40% da população.
Cenário atual
O atual cenário no Líbano em relação aos cristãos difere bastante de quando Israel invadiu o país em 1982. Na época, os israelenses tinham aliados poderosos entre os cristãos. O carismático Bashir Gemayel, que viria a ser eleito presidente, mantinha boas relações com o então ministro da Defesa israelense, Ariel Sharon. A ligação era profunda e ficou escancarada após o líder cristão maronita libanês ser morto em atentado terrorista antes mesmo de assumir a Presidência.
O ataque foi cometido por um grupo cristão libanês aliado da Síria, mas inicialmente atribuíram a ação a milícias palestinas. Revoltados, os seguidores de Bashir decidiram se vingar. Conhecidos como falangistas por integrarem a milícia/partido Falange (Kataeb, em árabe), fundada com inspiração no fascismo, esses milicianos cristãos maronitas mataram centenas de civis no massacre de Sabra e Chatila. Israel controlava esses campos e não fez nada para impedir as atrocidades cometidas por seus aliados.
O episódio gerou repúdio internacional, e os EUA pressionaram Israel a sair de Beirute. Os israelenses recuaram, mas mantiveram a ocupação do sul do país para lutar contra milícias palestinas, em aliança com uma milícia cristã local chamada Exército do Sul do Líbano, derivada da Falange, e liderada primeiro por Saad Haddad e depois por Antoine Lahad. Foram 18 anos de presença israelense na região até serem derrotados pelo antes inexistente Hezbollah.
Desta vez, o premier Benjamin Netanyahu não terá ninguém para apoiar suas ações militares no Líbano. Além da devastação provocada nos bombardeios israelenses, o primeiro-ministro, já visto como um pária em muitas partes do mundo, apenas provoca o aumento o sentimento anti-Israel no Líbano, mesmo entre aqueles que também são anti-Hezbollah.