Números de investimentos e das relações comerciais entre o Brasil e os EUA indicam que EUA precisam do país, mas que, sendo os maiores importadores do mundo, a dependência brasileira é maior.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, iniciou um novo mandato nesta semana anunciando profundas mudanças, como a saída do país do acordo climático de Paris, combate à imigração ilegal, mais liberdade para as redes sociais e taxação de países estrangeiros, por exemplo.
Uma declaração que chamou a atenção por aqui, entretanto, foi a de que o Brasil e a América Latina precisam “mais dos EUA do que os EUA precisam deles”. E que os Estados Unidos não precisariam do Brasil e da América Latina.
A ministra interina das Relações Exteriores, Maria Laura da Rocha, declarou que a diplomacia brasileira trabalhará para encontrar convergências na relação com o novo presidente dos EUA.
“O presidente Trump pode falar o que ele quiser. Ele é presidente eleito dos Estados Unidos. Nós vamos analisar cada passo das decisões que forem tomadas pelo novo governo. Mas acredito, que como somos um povo que tem fé na vida, que tudo vai dar certo sempre. Vamos procurar trabalhar as nossas convergências, que são muitas”, declarou a ministra.
Comércio entre os países
Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) mostram, por exemplo, que em 2024, o fluxo comercial entre Brasil e Estados Unidos chegou a cerca de US$ 81 bilhões.
Os números indicam equilíbrio na relação comercial com os Estados Unidos.
Em 2024, foram registrados:
- US$ 40,33 bilhões em exportações brasileiras para os EUA, novo recorde;
- US$ 40,58 bilhões em importações brasileiras dos EUA.
Números do Ministério do Desenvolvimento mostram os principais produtos exportados aos Estados Unidos em 2024.
Se destacaram produtos básicos ou semimanufaturados, como petróleo, aço, ferro, café, carnes, mas também produtos de maior valor agregado, como suco de laranja e aviões.
Veja abaixo:
- Óleos brutos de petróleo
- Outros produtos semimanufaturados de ferro ou aço não ligado
- Café não torrado, não descafeinado, em grão
- Pastas químicas de madeira
- Ferro fundido bruto
- Aviões e outros veículos aéreos, de peso superior a 15 mil kg, vazios
- Gasolinas, exceto para aviação
- Aviões e outros veículos aéreos, a turbojato
- Carnes desossadas de bovino, congeladas
- Produtos semimanufaturados, de outras ligas de aços
- Suco (sumo) de laranja
- Bulldozers e angledozers, de lagartas(máquinas pesadas usadas principalmente em construção, mineração e outros projetos de infraestrutura. O termo “de lagartas” representa máquinas com esteiras em vez de pneus).
- Carregadoras e pás carregadoras, de carregamento frontal
- Açúcares de cana
- Pedras de cantaria, trabalhadas de outro modo e obra
- Preparações alimentícias e conservas, da espécie bovina
- Querosenes de aviação
Ao mesmo tempo, as vendas dos Estados Unidos para o Brasil se concentram em produtos industrializados, combustíveis, produtos químicos, óleos lubrificantes e aviões, entre outros.
Ao todo, em 2024, foram importados mais de 6 mil tipos diferentes de produtos dos EUA.
Veja os destaques:
- Partes de turborreatores ou de turbopropulsores
- Turborreatores
- Gás natural liquefeito
- Óleos brutos de petróleo
- Gasóleo (óleo diesel)
- Naftas para petroquimica
- Hulha betuminosa (carvão mineral)
- Copolímeros (utilizados na fabricação de brinquedos, eletrodomésticos e autopeças)
- Óleos lubrificantes sem aditivos
- Polietilenos
- Adubos e fertilizantes
- Hidróxido de sódio (soda cáustica)
- Propanos liquefeitos
- Aviões e outros veículos aéreos, a turbojato
- Inseticidas
- Partes de aviões ou de helicópteros
- Medicamentos
Mulher com máscara do Brasil e uma pequena bandeira dos Estados Unidos vai a reunião nomeada “Go Trump, Go”, em frente à embaixada dos EUA em Brasília, em defesa à reeleição do presidente americano — Foto: Eraldo Peres/AP
De acordo com o presidente-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o Brasil, de fato, precisa mais dos Estados Unidos — o maior comprador mundial.
Mas ele ponderou que muitas empresas norte-americanas têm representação no Brasil, e que as trocas comerciais acontecem, neste caso, entre matrizes e filiais.
O executivo afirmou que a corrente de comércio (exportações mais importações) com os Estados Unidos pode crescer nos próximos anos, e avaliou que o Brasil precisa reduzir custos para melhorar sua competitividade.
Ele citou a importância da reforma tributária, que terá impacto gradual ao longo dos próximos anos, e elogiou a postura do presidente Lula de não arrumar confusão.
“Lula sabe muito bem que precisa deles. Tudo o que Lula falar não será bem recebido [pela posição ideológica diferente] Tem que ficar quieto mesmo, não dar frase negativa. Deixa assentar o pó, pois muitas coisas estão sendo faladas e nem tudo avaliado com a devida atenção”, declarou.
Empresas norte-americanas e investimentos
Quando se considera o investimento realizado no Brasil por países, de acordo com relatório divulgado pelo Banco Central no final do ano passado, trazendo dados relativos ao ano de 2023, os Estados Unidos lideram.
Tanto no conceito de “investidor imediato” (domicílio da empresa não residente que investiu diretamente na subsidiária ou filial) quando no de “controlador final” (residência do investidor que detém o efetivo controle e interesse econômico na empresa investida no Brasil).
Os dados referem-se à participação no capital, que considera as entradas de recursos em moeda ou bens relativos à aquisição, subscrição ou aumento total ou parcial do capital social de empresas residentes.
Dados do Banco Central citados pela Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) mostram o crescimento do número de empresas norte-americanas no Brasil, e também da participação dessas empresas no país.
Crescimento do número de empresas dos EUA e investimentos no país — Foto: Reprodução de estudo da Amcham (com base em dados do BC)
A Amcham também detalhou setores ligados a investimentos recentes no país, assim como informações sobre marcas norte-americanas e patentes no país. Os dados são do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
Investimentos, patentes e marcas dos EUA no Brasil — Foto: Amcham e INPI
De acordo com Abrão Neto, CEO da Amcham Brasil, os Estados Unidos e o Brasil têm uma relação econômica que gera benefícios para ambas as economias, que se caracteriza pelo alto valor agregado das trocas, complementariedade e diversificação no comércio bilateral.
“Os Estados Unidos são, para o Brasil, o principal mercado de exportação de bens industriais e de serviços. E os Estados Unidos são também o principal investidor estrangeiro no Brasil, com um estoque de mais de US$ 350 bilhões e quase quatro mil empresas americanas operando no país”, destaca Abrão Neto, da Amcham Brasil.
“É uma relação mutuamente benéfica, bastante longínqua, com um número considerável de empresas brasileiras nos Estados Unidos e americanas no Brasil”, prosseguiu.
Ele lembrou que os Estados Unidos tiveram superávit comercial com o Brasil, pelo menos, nos últimos dez anos, sendo que, apenas em 2023, o saldo positivo em favor das empresas norte-americanas foi de quase US$ 24 bilhões — o sexto maior superávit que os EUA tiveram com qualquer outro parceiro individual.
“É importante destacar também que há uma integração muito saudável entre a economia brasileira e americana que se reflete no perfil do comércio bilateral”, acrescentou.
Na prática, “existem exportações brasileiras de insumos, partes e peças e bens de capital e da mesma forma, o Brasil importa não só bens acabados, mas um número bastante considerável de insumos para o seu setor produtivo”.
Para o CEO da Amcham Brasil, um bom exemplo da ligação comercial entre os países é o setor aeronáutico, no qual o Brasil exporta e importa bilhões de dólares em partes e peças de naves e aeronaves acabadas.
“Então essa integração mostra uma interdependência e uma complementariedade no comércio entre os dois países”, concluiu.