Segundo analistas, os dois países têm fortes motivos para administrar divergências e questão agora é quando ambos encontrarão caminho de volta às negociações
A presença de objetos voadores sobre o espaço aéreo da América do Norte tem chamado a atenção das autoridades mundiais e da população em geral.
No início do mês, os Estados Unidos derrubaram um suposto balão espião de origem chinesa que sobrevoava a costa da Carolina do Sul. Entre sexta-feira (10) e o último domingo (12), três objetos voadores não identificados foram derrubados nos Estados Unidos e no Canadá. Até a noite de domingo, não havia confirmação se a China tinha relação com os eventos.
Diante desses fatos, há uma incerteza em relação ao futuro das relações diplomáticas entre Estados Unidos e China.
No dia 3 de fevereiro, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, anunciou o adiamento de sua viagem naquele fim de semana à China devido à presença do balão.
Quando Blinken, cancelou sua viagem a Pequim, ele escolheu as palavras com cuidado. O lançamento de um balão espião feito pela China em um voo de alta altitude sobre os Estados Unidos foi inaceitável e irresponsável, disse ele. Mas estava apenas adiando, e não cancelando, sua visita.
Uma semana depois, o balão da China foi derrubado. a viagem continua sem nova programação e a derrubada dos objetos voadores entre sexta e domingo levantou questionamentos sobre se um adversário havia enviado mais espiões ao espaço aéreo norte-americano.
Ainda assim, dizem os analistas, os dois países têm fortes motivos para administrar suas divergências. A questão agora é quando, não se, eles encontrarão o caminho de volta à mesa de negociações.
“O secretário Blinken falou sobre adiar a viagem, não cancelá-la ou encerrar todas as comunicações previsíveis de alto nível com o governo chinês”, disse o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, na semana passada. “Isso não vai acontecer.”
A China quer reviver sua economia, ainda se recuperando da política esmagadora de “Covid zero”. Para tanto, o presidente chinês, Xi Jinping, espera melhorar as relações que atingiram um nível perigoso em agosto com a visita a Taiwan da então presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, e persuadir os legisladores americanos a não impor novas regras destinadas a frustrar os esforços da China para produzir semicondutores avançados.
E enquanto os observadores dos EUA tinham poucas esperanças para a viagem de Blinken à China, diplomatas dizem que uma visita de alto nível é necessária para colocar uma “base” no relacionamento e fazer progressos em questões que vão desde o fentanil chinês até os americanos detidos no país.
Diálogo impactado
Reiniciar as conversas entre Estados Unidos e China não será fácil. O voo do balão chinês causou indignação em Washington, com políticos criticando os militares dos EUA e o presidente, Joe Biden, por não derrubá-lo quando o objeto entrou no espaço aéreo americano.
O Ministério das Relações Exteriores da China reagiu com raiva às alegações de espionagem feitas por Washington, dizendo que o balão era uma nave de pesquisa civil e acusando os Estados Unidos de hipocrisia.
O Pentágono disse na semana passada que a China recusou um pedido dos EUA para um telefonema entre o secretário de Defesa, Lloyd Austin, e o ministro da Defesa chinês, Wei Fenghe.
No entanto, isso não significa que a reaproximação possa não acontecer.
“Embora seja muito comum que os chineses se recusem a se envolver no canal militar-militar quando é mais necessário –em uma crise– isso não significa que os chineses desistiram de seu esforço para ganhar tempo acalmando as relações com os EUA e o Ocidente”, disse Daniel Russel, o principal diplomata dos EUA para o Leste Asiático durante o governo do ex-presidente Barack Obama.
Os líderes dos Estados Unidos também disseram que os canais de comunicação devem permanecer abertos, mesmo chamando o episódio de violação da soberania dos EUA, informando dezenas de países sobre o que dizem ser um programa global de vigilância chinesa e adicionando seis entidades chinesas a uma lista negra de comércio.
Biden disse que o balão precisava ser derrubado, mas minimizou tanto a ameaça à segurança quanto o impacto nas relações EUA-China.
Na quinta-feira (9), ele disse que o incidente não foi uma grande violação de segurança, observando que “a quantidade total de coleta de inteligência que está acontecendo em todos os países do mundo é esmagadora”.
Tensão e erros
Em entrevista à CNN neste domingo (12), o professor de relações internacionais da ESPM Gunther Rudzit disse que a tensão entre os dois países está muito alta e que ainda é cedo demais para atribuir todas as responsabilidades.
Sobre o balão chinês abatido, o especialista não descarta, inclusive, a possibilidade de um erro interno.
“Mesmo o governo chinês não é uma máquina computacional infalível que tem o controle de tudo. Existe a possibilidade de que um dos ramos das Forças Armadas chinesas responsável por essa área de ‘controle meteorológico’ utilizando esses equipamentos tenha enviado esse balão sem que realmente o governo central tivesse conhecimento. Isso não é novidade. Nem todo governo consegue controlar todos os seus ramos”, disse Rudzit.
Uma chance às conversas
Com exceção de uma visita de alto nível, há oportunidades para a diplomacia. Em um relatório de Berlim, o portal “Politico” citou diplomatas dizendo que o principal diplomata da China, Wang Yi, com quem Blinken se encontraria em Pequim, participaria da Conferência de Segurança de Munique deste ano, marcada para 17 a 19 de fevereiro.
Blinken também comparecerá ao evento, embora nenhum dos lados tenha dito que os dois podem se encontrar lá.
Outra chance será uma viagem à China da secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen. Na quarta-feira, Yellen disse que ainda espera ir à China, sem dar detalhes sobre o cronograma, e o ministério do comércio da China disse na quinta-feira que acolheu a disposição dela de realizar a visita.
Embora úteis, essas reuniões só podem preparar o terreno para o diálogo profundo e de alto nível necessário para fortalecer os laços.
Blinken pode se encontrar com os chineses em Munique ou na reunião dos ministros das Relações Exteriores do G20, na Índia, em março, mas ele precisa visitar Pequim e se encontrar cara a cara com Xi Jinping para garantir que mensagens sobre questões espinhosas como Taiwan e Rússia sejam transmitidas, disse Russel.
As novas restrições dos Estados Unidos às empresas chinesas e o desejo anunciado do presidente do Comitê Republicano da Câmara, Mike McCaul, de visitar em abril Taiwan, a ilha reivindicada pelos chineses, “podem ser a gota d’água” de tais esforços, acrescentou.
Bonnie Glaser, especialista em Ásia, do German Marshall Fund dos Estados Unidos, alertou que as pressões domésticas em ambos os países podem significar que é muito cedo para qualquer um dos lados se reaproximar.
“Os chineses não querem parecer fracos e provavelmente não querem admitir que mentiram (sobre o balão). O presidente Biden também está sob pressão dos republicanos no Congresso, que insistem que o balão deveria ter sido derrubado antes”, disse Glaser.
EUA e Canadá não estão sozinhos
Após forças dos Estados Unidos e Canadá identificarem objetos voadores sobrevoando seus territórios, desta vez as autoridades de China e Uruguai relataram que encontraram objetos não identificados perpassando os céus dos países.
A própria China informou neste domingo (12) que identificou um objeto voador não identificado próximo à cidade de Rizhao, na costa leste do país, segundo informações do jornal estatal chinês “Global Times”.
Já o Uruguai comunicou que foram relatadas imagens de luzes atípicas no céu das Termas de Almirón, próximo à cidade de Paysandú, e que uma divisão de investigação já foi acionada para apurar os fatos.
Até o momento, não foram divulgados detalhes sobre os objetos encontrados em ambos os países.
(Com informações da Reuters e da CNN Internacional. Publicado por Pedro Zanatta)
Fonte: CNN Brasil / Foto: Randall Hill