Após perder filha afogada pai faz apelo “esqueçam o celular”

Por causa de um instante, podemos sentir uma dor pelo resto da vida

 

Quando saiu de casa na manhã do dia 14 de abril de 2017, o guia de viagens Alex Delgado, de 49 anos, não imaginava que, nas horas seguintes, a vida dele se transformaria em um verdadeiro pesadelo. Ao chegar à sua residência, em Orlando, nos Estados Unidos, o brasileiro notou a presença de vários polícias e bombeiros em frente ao local, indicando que um incidente grave havia acontecido. “Eu entrei e vi que estavam tentando ressuscitar minha filha, não sabia de nada, fiquei maluco”, contou o profissional em entrevista exclusiva à CRESCER. A pequena Susan, de 2 anos, tinha se afogado na piscina da família e, mesmo depois de ser levada ao hospital, acabou não sobrevivendo.

Natural de São Paulo (SP), Alex se mudou com a família para os Estados Unidos em 2011, por conta do trabalho. Na época, ele só tinha um filho, hoje com 12 anos, mas três anos depois, a caçula chegou para aumentar a família. Ele disse que a garotinha era muito amorosa com as pessoas, sendo a alegria da vizinhança. A morte da criança deixou a cidade muito abalada, mas acabou levantando uma questão importante sobre os perigos de deixar os pequenos sozinhos em locais com água.

Para evitar que outros pais passem pelo mesmo sofrimento que ele, o agente de viagens criou o projeto Susan Forever, que visa combater o afogamento infantil. Atualmente, ele está empenhado em aprovar uma lei que estabeleça regras para prevenir os afogamentos das crianças e conscientizar sobre uma das principais causas de mortes acidentais do mundo. “Não tire os olhos das crianças, esqueça o celular. Por causa de um instante, podemos sentir uma dor pelo resto da vida”, alertou o pai. Segundo ele, o intuito é tornar o dia 14 de abril — data em que Susan se afogou — em um Dia Nacional contra o Afogamento Infantil.

“O afogamento é silencioso”

 

“Nós podemos brincar na água, mas não podemos brincar com a água”. Esse é o alerta que o agente de viagens faz a todas as famílias que têm crianças em casa, especialmente em residências com piscinas. Na casa de Alex, a piscina ficava em uma área gourmet e era protegida por uma porta trancada e uma cerca para evitar que as crianças tivessem acesso ao ambiente.

No dia em que Susan se afogou, a família recebeu a visita de duas amigas. Em determinado momento, a mãe precisou deixar a menina sob os cuidados das visitas. No entanto, uma das mulheres estava muito distraída, mexendo no celular e foi para área externa da residência, deixando a porta e a cerca que davam acesso à piscina abertas. Quando a jovem retornou para a área interna, acabou fechando a porta, sem perceber que a menina tinha ficado do lado de fora.

Quando saiu do banho, a mãe de Susan entrou em desespero, pois não conseguia encontrar a menina. Após procurá-la em diversos cômodos e até mesmo dentro dos armários, ela suspeitou que a garotinha poderia estar na piscina. Ao chegar na área externa da casa, ela viu uma cena angustiante: a pequena estava na água, inconsciente.

Imediatamente, a mãe pulou na piscina para tirar Susan da água e chamou a emergência. Nessa época, ninguém na casa sabia como fazer os procedimentos de primeiros socorros, então, tiveram que esperar o serviço de emergência, que demorou cerca de 10 minutos. Alex se lembra desse dia como se fosse ontem. Ele entrou com a filha na ambulância e foi, às pressas, para o hospital.

Na unidade de saúde, os médicos explicaram para o pai que Susan ficou muito tempo sem oxigênio e poderia não resistir ou ficar com sequelas gravíssimas. Nesse momento, os profissionais de saúde já orientaram a família a se despedir da criança. Após 14 horas lutando pela vida, Susan faleceu. “Eu perdi os sentidos, ela tinha uma vida inteira pela frente”, lamentou Alex.

O projeto

 

Em 2018, após a morte da filha, Alex se mudou para Londres, na Inglaterra, para ficar perto da família. Em meio ao luto, ele acabou se deparando com uma situação que o levou a um novo caminho. Certa vez, enquanto comprava alguns ingredientes para fazer uma pizza, Alex viu um bebê que estava ficando roxo e sem respirar em um carrinho próximo à mãe distraída. Rapidamente, ele correu para avisá-la e logo a orientou a fazer a respiração boca a boca, o que permitiu que a criança voltasse a respirar. “Na hora, todo mundo começou a bater palma. Aquele momento não tirou a minha dor, mas me trouxe um refrigério. O meu futuro era salvar as crianças e não deixar que os pais passassem pela minha dor”, destacou o agente de viagens.

Em 2019, nasceu o projeto Susan Forever e Alex começou a divulgar informações sobre afogamentos e dar palestras para conscientizar as famílias. Segundo ele, ao entrar no submundo desse tema, ele se deparou com inúmeros histórias de famílias enlutadas, mas também de crianças que sobreviveram, mas ficaram com sequelas gravíssimas.Diante desse cenário tão assustador e preocupante, Alex se dirigiu à Brasília para lutar por uma lei que estabelecesse medidas para evitar o afogamento. O projeto de lei 1944/2022, apresentado pelo senador Eduardo Gomes, acrescenta medidas específicas para a prevenção dos afogamentos de crianças em piscinas.

Alex explica que as regras propostas valerão tanto para piscinas públicas quanto para piscinas em locais privados, como condomínios e hotéis. Algumas das medidas propostas incluem: impedir o acesso da criança à piscina, instalar uma barreira física entre a piscina de adulto e infantil e instalação de sensores e alarmes para indicar se alguém acessar a área da piscina em horários que ela já está fechada. O projeto de lei também estabelece que seja contratado um salva-vidas em casos de festas ao redor da piscinas e que um dos membros da família que tenha piscina em casa faça o curso de primeiros socorros.

Quanto às medidas de segurança em casa, Alex recomenda que os pais fiquem sempre atentos às crianças e dificultem o acesso delas à piscina. Além disso, é importante não terceirizar o cuidado dos filhos, não ficar no celular enquanto as crianças estão na água e, se possível, colocar os filhos na natação. “Eu não posso evitar que uma criança tenha câncer, mas posso prevenir o afogamento. Gostaria de saber antes, o que eu sei hoje”, finalizou o agente de viagens.

Dicas para prevenir o afogamento

 

Para evitar uma tragédia, é essencial tomar alguns cuidados para proteger seu filho de situações perigosas na água. Confira!

Olhar atento

É fundamental lembrar que o afogamento é uma ocorrência rápida, portanto a vigilância é o principal cuidado. Por isso, as crianças nunca devem ser deixadas sozinhas em praias, piscinas e banheiras. Além disso, é importante não deixar recipientes com água ou outros líquidos onde a criança possa submergir, pois apenas 2,5 cm de altura de líquido em um recipiente podem ser suficientes para causar um desastre. Isso também se aplica para as crianças que já sabem nadar bem.

Os pais devem sempre exercer a intensa monitorização e evitar distrações, como o uso do celular. Outro ponto interessante é investir em um treinamento de primeiros socorros, mesmo quem não trabalha na área da saúde.

Longe dos banheiros

O banheiro pode representar um dos cômodos mais perigosos para as crianças em relação ao risco de afogamento. Por isso, mantenha sempre portas de banheiros fechadas, banheiras vazias e os recipientes como bacias e baldes vazios e virados ao contrário.

É importante também ficar atento à privada, que pode se tornar um perigo. É recomendável instalar uma trava na tampa do vaso sanitário, uma vez que crianças que engatinham e já estão conseguindo se levantar com apoio podem cair de cabeça dentro do vaso sanitário.

Colete salva-vidas

Ao levar as crianças para a praia ou para a piscina, é importante lembrar que o uso do colete salva-vidas é mais indicado do que as boias de braço. No entanto, fique atento, pois o uso dos coletes de segurança são excelentes, mas podem causar a falsa sensação de segurança. Então, mesmo em uso destes equipamentos, vale reforçar que as crianças nunca devem ser deixadas sem supervisão de um adulto em piscinas e praias.

Piscinas cercadas

Os pais que possuem piscinas em casa precisam ter atenção redobrada. As piscinas devem ser cercadas totalmente, sem aberturas e com altura em torno de 1,5m de altura, além de contar com pisos antiderrapantes ao seu redor. O mesmo cercamento deve ser realizado se tiver poços em casa ou em chácaras e sítios. Além disso, a piscina deve ser coberta com várias travas laterais seguras, que a criança não consiga retirar.

Coloque a criança na natação

Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), os bebês já podem começar a prática após seis meses de vida, pois nessa fase da vida, o ouvido está em um estágio de desenvolvimento que reduz o risco de entrada de água e infecções, além da criança já ter recebido as primeiras vacinas de imunização.

No entanto, as crianças nunca devem entrar na água sem supervisão, mesmo que já saibam nadar bem. Também vale lembrar que não é preciso uma grande quantidade de água para que os pequenos sejam colocados em uma situação perigosa.

Os afogamentos são muitas vezes silenciosos. Fique atento aos sinais de alerta como: não conseguir manter a cabeça inteiramente fora da água, expressão de pânico ou medo e corpo na vertical com cabeça inclinada para trás e boca aberta, uma tentativa instintiva de continuar respirando.

Fontes: Globo.com/ Monique Pinheiro, pediatra do Grupo Prontobaby e Hamilton Robledo, pediatra na Rede de Hospitais São Camilo, de São Paulo. Foto: arquivo pessoal 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *